terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

10.500km mais feliz

4 países em 21 dias. Dezenas de cidades, centenas de pessoas, 10.500km no lombo de uma moto. Deserto, praia, frio, calor, fome, cerveja, comida boa, pequenos sustos, boas surpresas, cansaço, saudade de casa, corpo moído e um sorriso enorme na cara. 

Um dia postei na comunidade Lhamas (nosso grupo de motociclistas) "Atacama 2011, quem vai?"

O silêncio se seguiu. Imaginei aquela bola de feno passando no deserto com o barulho do vento. Pensei comigo: já viajei bastante sozinho mas não tenho experiência para tanto e a vida me mostrou que certas viagens não se faz solo. 

Na sequencia muitas perguntas sobre roteiro, alguns amigos simplesmente escreviam "nem fodendo...", "num vai dá...", "tô sem grana...", etc. Nenhum admitiu que simplesmente a mulher não deixava, a mãe não deixava, a consciência não deixava mas todos invariavelmente (em pensamento pelo menos) já estavam lá, no meio do deserto. Motoqueiro é assim.

Eu já tava decidido a não ir sozinho, achei que o tópico ia virar piada. Eis que, de repente, o cara que não falta em um evento Lhama escreve: "ovô" - tradução do dialeto Lhama: Eu vou.

Aí pensei: fodeu. Pior, todo mundo se ligou que a trip ia sair mesmo porque se o Ed falou que vai é porque vai. E se eu falei que ia é porque ia.

Após muita conversa e especulação, muitos prováveis participantes, contas, pedidos pra família, orçamentos, noites sem dormir, provocações, frases de incentivo tipo "ah tá, duvido..." sobraram 2 motos.

Fodeu! Fomos. E graças a Deus voltamos! 

Este blog foi criado pra servir de roteiro básico pra quem sonha em rodar pelo Atacama e parte do Mercosul. Básico porque nada é muito programável numa viagem de moto. Básico também porque esta viagem foi feita sem nenhuma reserva. Motos e cronogramas fixos não combinam. O máximo que se pode ter é uma meta diária que pode ser interrompida por N motivos, desde uma chuva de pedra até a simples vontade de ficar horas parado olhando uma paisagem.

Abaixo seguem algumas fotos e links para mais destas fotos. 

A sequencia é um roteiro básico com uma breve explicação de cada trecho percorrido com dicas, quilometragens e mapas pra quem nunca foi mas tá com aquela coceira na palma da mão pra acelerar.

Pare de pensar e pegue a estrada. Vale cada km rodado!


Algumas fotos da trip

Mais fotos em:


http://www.facebook.com/album.php?id=1281461094&aid=104046

e

flickr.com/photos/21522460@N02/



Ed (hein?) - Parceiro de viagem

Estación de Servicio - Susquez

Salta

Galera do RJ

Caracoles Argentinos

Lhamas do Atacama - Salar

Atacama - Salar

Atacama - Salar

Susquez

Atacama - Salar

San Pedro de Atacama 

Baldhead - Vulcão Licancabur

San Pedro de Atacama - Vale de la Luna

San Pedro de Atacama - Vale de la Luna

San Pedro de Atacama - Vale de la Luna

San Pedro de Atacama - Vale de la Muerte

San Pedro de Atacama - Vale de la Muerte

Paposo

Paposo

Tal Tal

Tal Tal

La Serena

Santiago

Caracoles

Caracoles

Caracoles

Divisa Chile Argentina

Mendoza

Córdoba

Punta

É Lhama!

Trecho: São Paulo > Foz do Iguacú – Castello Branco e BR 369 – 1050km

Sem segredo. Só lembre-se de bons óculos escuros porque no fim de tarde (chegando em Foz) o sol se põe no fim da pista, bem na sua cara. Quase não dá pra ver onde você tá indo. Anoitece quase 9 da noite agora em janeiro lá. Sampa pela Castello até o fim. Mais rápida e melhor que a Régis (onde já se cobra pedágio mas a estrada ainda é um lixo), escapando da porcaria da Serra do Cafezal e seu trânsito eterno.

Trecho: Foz > Corrientes – AR – Ruta 12 - 605km

Sussa. Aduana meio pentelha. Argentinos estressados e sem muita educação mas sem maiores problemas fora a burocracia. Passaporte é mais rápido. Com identidade precisa preencher o “Permiso”. Não revistaram as malas. Faça câmbio na própria aduana. Após a entrada existe um parque nacional, velocidade 80. Melhor andar de boa porque tem uma barreira da Gendarmeria poucos km´s a frente. Pararam, pediram docs, ficaram curiosos com as motos e não encheram o saco.
Leve pesos argentinos. A maioria dos lugares não aceita cartão e quando aceita é tudo mais caro. Dão até 20% de desconto em tudo com cash na mão na Argentina toda. Já no primeiro posto de gasolina os frentistas se aproveitam de turistas sem cash pra fazer um câmbio digno de ladrão com Reais. Mínimo de abastecimento com cartão = 100 pesos. Um tanque vazio de moto não dava 50 pesos, ou seja, tenha grana na mão.
Almoce em Posadas (meio do caminho). Restaurantes bons e baratos na “orla” do Rio Paraná. Vai comer um prato que custaria 100 Reais aqui por 25. Com direito a cerveja, enfeitinho no molho, ambiente cuzão e, é claro, com a roupa da estrada suado e sujo, pensando que os Argentinos vão ficar horrorizados. Que nada, todo mundo ama aventureiros.
Fomos levados até os restaurantes por uma baita gostosa que percebeu a gente perdido no trânsito e parou pra ajudar sem que a gente pedisse.
Aqui comecei a amar a Argentina, e as argentinas.
Cuidado com os faróis de trânsito. Não são como no Brasil e não ficam no alto e sim nas esquinas em postes baixos. Varei o primeiro sem perceber e o motorista de um ônibus buzinava e ficava imitando galinha com os braços pra mim. Nem quero saber o que significa! Kkk
Corrientes tem um centro caótico, centenas de “motoboys” sem capacete e famílias inteiras em scooters, com crianças no meio dos pais, sacolas de supermercado nas mãos, igualmente sem capacete. Nordeste é nordeste. Não caia na tentação de tirar o seu com placa gringa. O centro é uma zona mas a avenida “Costañera” (tudo que beira a água por lá chamam de costañera – costeira – mesmo sendo um rio) é bem legal, cheio de gente até altas horas pescando, tomando mate, passeando e curtindo a boemia.
Nesta avenida ótimos bares, gente bonita. Hotéis baratos no centro.


http://www.sanmartin-hotel.com.ar/

Trecho: Corrientes > Salta – AR – Ruta 16 – 830km (de reta sem fim! Putaquepariu!)

Aqui é que o bicho pega. É a estrada mais perigosa (animais soltos, sem acostamento, mão dupla) e mais problemática (mais que o deserto até). Os postos de gasolina são escassos e tem até 200km um do outro. Muitos simplesmente ficam sem gasolina. Não existem hotéis e o combustível pode chegar só no outro dia (cheguei a pensar em barraca e saco de dormir). Minha sorte foi o filtro K&N que aumentou muito o desempenho. Entre dois postos rodei 250km. Pra rodar solo leve galão. Muitos animais na beira da pista, burros, cavalos, cabras e insetos de monte. Levar lustra móveis para a viseira. São 800km de reta. Um pé no saco. Parece que vc tá numa esteira e do lado roda uma paisagem sem fim, totalmente igual (cerrado). Aqui é a “Planície Del Chaco”, onde fica a Pampa Del Infierno e é quente como o nome diz. Moleza, sono, cansaço. Caminhões agrícolas, asfalto ruim em alguns trechos. Nada pra fotografar. A dica aqui é encher o tanque. Se você completou, andou 90km e tiver outro posto pare e complete, fazendo assim até chegar em Salta. Sempre pergunte a quantos km fica a próxima “Estación de Servicio” e a seguinte. Como disse, pode ter gasolina somente na segunda. Aliás faça o mesmo procedimento no Chile e também na volta por Mendoza via Santiago porque é comum durante todo este trajeto trechos de 150 a 200 km sem uma “Estacíon de Servicio” qualquer.
Depois do retão sem fim uma serra “de leve” leva até Salta. Detalhe, já nessa serra “de leve” você vai ter a sensação de nunca ter visto uma serra de verdade no Brasil.
Salta é fantástica de dia e de noite. A cidade é linda, as mulheres são lindas, tem uma rua só com bares, um melhor que o outro perto do centro. Tome Cerveza Salta, fazia tempo que não experimentava cerveja tão boa. Comida absurda. Suba até o topo do morro onde tem o teleférico pra ver o por do sol. É do caralho, vide fotos.

Apart Hotel show de bola (R$ 50 por cabeça): http://www.hotelapartho.todowebsalta.com.ar/

Trecho: Salta – AR – San Pedro de Atacama – CH - Ruta 52 AR/25CH – 600km

São 600km mas é bom acordar cedo, colocar calça segunda pele (sim, de manhã é friozinho mesmo no verão e na hora que chegar no deserto é gelado). A subida foda é já no início. As motos foram na boa (Efi e carb.).
A minha só cuspiu um tantico de óleo pelo filtro. Ambas não passaram de 110 lá em cima (80 a Efi), mesmo com o cabo enrolado. Conforme bate o vento elas desenvolvem mais ou menos pela entrada de ar. (coloque um K&N!). Num grupo de cariocas que subiu com a gente tinha uma R1 e uma Falcon. A Falcon engasopou lá em cima mas depois que pegou foi de boa. Vale a pena ir parando pra aclimatar. Aproveite as paradas pra mijar e tirar fotos pra isso. Depois das 4 da tarde a coisa complica. Se você para começa a fritar, se anda é gelado e o vento tem rajadas que fazem a moto pular de uma faixa pra outra como se fosse uma bicicleta na beira da pista quando passa caminhão. Adrena! Sensacional. Nariz seca, cutículas desaparecem em minutos e a boca racha. O último posto é logo antes da aduana, em Susques e é clandestino, ou seja, fica escondido na segunda entrada (Norte) da cidade. Os locais não comentam (acho que é pq falta gas pra eles tb) e a placa fica virada ao contrário. O posto que fica do lado do hotel/restaurante na estrada está fechado. Depois daí é só chegar até San Pedro, que também tem um único posto para a cidade toda. O deserto é foda (no bom sentido). Você vai querer parar a cada 5 minutos, sentar e ficar olhando praquilo porque a cada curva (ou retão sem fim) é uma surpresa. As montanhas, os caracoles, os salares, as lhamas. Não dá pra descrever, só indo. San Pedro é igualzinho a São Thomé das Letras. Cidade de maconheiro de noite e de famílias de turistas de dia. Uma infraestrutura de merda. Hotéis caros ou albergues toscos que ficam sem água depois das 6 da tarde. Chegamos sábado de noite, nos fodemos, tivemos que ficar em um destes, sem banho...
Os passeios de van pelo deserto são baratos e fantásticos. Se tiver uma BM vá de moto mesmo mas com as nossas tranqueiras, melhor de van. Comida boa e preço bom. Gente do mundo inteiro. Drogados mil, discos voadores, incenso. Servem lhama assada.
No segundo dia encontramos um hotel melhorzinho.

Hotel Tambillo (US 40 per head): http://www.hoteltambillo.cl/

Trecho: San Pedro – Antofagasta (devia chamar Antofobosta) – Tal Tal - Rutas 25/5/1 - 515km

Antofagasta é uma bosta. Só tem favela e ladrão naquela merda segundo um local que falou com a gente já na chegada. Energia ruim. Passe reto e vá até Tal Tal, cidadezinha fantástica de 11k hab. Hotel Mi Tampi, bom e barato. Aqui começamos a encontrar todo o povo do Dakar (organizadores, fãs e tudo mais). Vários carros e motos do rali pela estrada.
Aqui dá mais cagaço (antes e depois de chegar a Tal Tal) que no Atacama pq tem pouco movimento nas estradas mas mesmo assim é deserto. É quase no lugar do incidente com os mineiros da cápsula. Vimos vários carros largados no meio do nada acidentados e um inclusive com um presuntão esticado a uns 50m do carro capotado com 2 locais do lado esperando a polícia. Devia estar lá desde o outro dia pelo jeito, medonho. Siga para Paposo para chegar a Tal Tal, sensacional. Uma cidade parada no tempo (1960). Povo muito simpático.
Na descida da serra antes de chegar a Paposo pare para tirar fotos no mirante onde tem a santa. É de tirar o fôlego (fotos anexas), a estrada é de cagar de linda. Rodamos a 50km/h aqui só babando e olhando pros lados.

Hotel Mi Tampi (Tal Tal): http://www.hotelmitampi.cl/